Joyce Galvão é uma chef engenheira. Uma engenheira que é chef. Tudo por conta de uma curiosidade em entender como os processos na cozinha funcionam. “Queria trabalhar com alguém que pudesse me responder as questões mais profundas sobre a área”, diz. Por isso, terminado o curso de gastronomia, na Anhembi Morumbi, resolveu iniciar a graduação em engenharia de alimentos.
Mas como essa história começou? “Quando fui escolher uma profissão, não se falava muito em gastronomia, então acabei me inscrevendo no curso de medicina”, lembra ela. Mas o amor pela cozinha e pelo programa da Ofélia, na televisão, eram imensos. Tão grande que, só depois do vestibular, viu que estava no caminho errado e resolveu transformar o hobby (a cozinha) em profissão. “Meu pai me apoiou, mas muita gente da família ficou espantado e passou a me criticar. Diziam: ‘Tínhamos uma médica e agora temos uma cozinheira?’”
Na verdade, uma engenheira. E sem medo de experimentar. “Trabalhei em bufê, hotel, restaurante, confeitaria… Lavei prato, escrevi para a seção de gastronomia de uma revista…”, conta Joyce sobre suas experiências culinárias.
Era 2007, quando estava no terceiro ano de faculdade, ela recebeu um convite do El Bulli, o restaurante do famosos Ferran Adrià, para trabalhar na Fundação Alicia, um centro de pesquisa culinária que busca melhorar a saúde das pessoas a partir da alimentação. “Larguei tudo e fui. O laboratório de pesquisa, que ainda nem estava aberto, estava vazio, não tinha nem maquinário ainda. Vi tudo ser montado”, conta. Dali, foi um passo para trabalhar no El Bulli e, na sequência, também no premiado El Celler de Can Roca. Nessa fase, não só Joyce aprendeu muito, como conheceu outros cozinheiros e deu consultoria para hotéis em Londres. Aos poucos, foi sedimentando seu interesse pela confeitaria.
“As reações químicas dos alimentos são mais visíveis na confeitaria, mais fáceis de serem explicadas e manipuladas. Além disso, sempre gostei mais de comer doce do que salgado, então acredito que não poderia ser uma cozinheira tão boa quanto seria confeiteira”, explica. Quando voltou ao Brasil, em 2009, Joyce se desdobrou em inúmeras atividades: dava aula (Ela ainda dá! Veja o que aconteceu no curso de bolos que Joyce ministrou no Instituto Brasil a Gosto), consultoria para empresas, abriu uma confeitaria (que não existe mais, mas que funcionou por seis anos), escreveu um livro, A Química dos Bolos (Companhia de Mesa).
“Há 10 anos a gastronomia brasileira não era tão conhecida quanto é hoje. Pelo menos não dentro do nosso próprio país. Agora ela já está encaminhada: tem mais cozinheiros dedicados a aprender e a entender melhor, modernizar os pratos mais tradicionais, usar as influências que temos no nosso próprio país. Mas a confeitaria ainda é uma bagunça. Sabemos muito pouco da origem e das histórias dos nossos doces. Se você pede para qualquer brasileiro indicar um doce nosso, a não ser que ele esteja no Nordeste, certamente vai falar brigadeiro. A meu ver, não existe uma confeitaria brasileira”, diz Joyce, que trabalha para mudar essa realidade com seus cursos – como o que ministrou no Instituto Brasil a Gosto, em junho – e também com o evento Compartir, que ela criou justamente para discutir a confeitaria nacional e sua construção.